quinta-feira, 19 de março de 2015

Crítica: A Pedra de Paciência | Um Filme de Atiq Rahimi (2012)


Quando um herói de guerra do Afeganistão (Hamidreza Javdan) é abandonado por seus companheiros do Jihad, pela mãe e irmãos após levar um tiro na nuca em uma estúpida discussão. Sua vida fica assim aos cuidados de sua jovem esposa (Golshifteh Farahani), que busca em meio às dificuldades recuperá-lo de seu estado vegetativo, ao mesmo tempo em que começa a relatar através de confissões solitárias ao marido em coma, todos os seus sonhos, segredos e suas lembranças que mantinha em cativeiro dentro da alma. “A Pedra de Paciência" (Syngué Saubour, 2012) é um drama de guerra dirigido pelo escritor e cineasta afegão Atiq Rahimi (o seu segundo longa-metragem após “Terra e Cinzas”, de 2004). Tendo como base o seu premiado romance (ao qual o escritor foi agraciado em 2008 com o Prêmio Goncourt por está obra), Atiq Rahimi consegue em parceria com o roteirista Jean-Claude Carrière realizar uma transposição a altura de sua base literária. Essa produção foi selecionada para representar o Afeganistão no Oscar 2013 na categoria de Melhor Filme Estrangeiro, mas infelizmente não obteve indicação. Sobretudo, o trabalho de Atiq Rahimi possui inúmeras qualidades que não necessitam necessariamente da aprovação de críticos acadêmicos para ser notada. Considerando que o filme em suma é uma transposição sensacional do romance que tem na pauta discutir sobre a opressão que as mulheres afegãs são sujeitadas em meio a um panorama social e político difícil, essa produção tem em sua estética e narrativa, contornos simplistas marcados de realismo e poesia.

A Pedra de Paciência" tem um desenvolvimento simples em sua aparência e apurado em sua mensagem. Essa produção retrata a instabilidade política que assola o país, e os perigos que rodeiam a população. E em meio a isso, o espectador acompanha a desolada esposa que busca, com todo despreparo possível (pobre, refugiada nas dependências de uma casa em ruinas, tendo que alimentar as duas filhas sem dinheiro e cuidar de seu marido incapacitado numa vigília solitária) cumprir com suas obrigações. As circunstâncias extremas desse panorama desencadeiam de forma inusitada reflexões e revelações disparadas ao marido sem interrupções, e que ganham sentido através de uma antiga fábula afegã e que confere explicação ao título do longa-metragem. Anos de um obediente silêncio são quebrados sem o temor de uma censura, e amarras óbvias estabelecidas pela cultura são ignoradas resultando num extenso e fascinante monólogo de uma vida. Golshifteh Farahani entrega uma personagem crível e bem elaborada dentro da proposta do filme, e que aproveita com habilidade essa oportunidade. Embora haja outros personagens no decorrer do desenvolvimento das narrações (a tia que a certa altura torna-se essencial na sobrevivência dela, e o surgimento do soldado que enfatiza as mudanças que vão surgindo em sua vida), esses apenas margeiam a grandiosidade de seu desempenho, que dá forma ao comportamento humano e as agruras de uma cultura distante que procura anular a presença feminina dentro da sociedade.

De certo modo, “A Pedra de Paciência" é um filme lento, mas distante de ser tedioso. Visualmente limitado, mas elegantemente bonito devido a uma direção de fotografia funcional, suas maiores qualidades se encontram em sua essência narrativa. Embora o clímax das revelações perca um pouco de sua força em função de um desfecho de pouca elaboração, o trabalho de Atiq Rahimi, aliado ao talento de Golshifteh Farahani se mostra uma grata experiência cinematográfica. Um delicado e sempre necessário manifesto em prol da liberdade.

Nota: 8/10


4 comentários:

  1. Valeu pela dica,

    Não conhecia este filme e gostei da premissa.

    A atriz principal foi a protagonista do ótimo "Procurando Elly".

    Abraço

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    1. Não assisti ainda a esse "Procurando Elly". Darei uma procurada por este também.

      abraço

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  2. eu fiquei chocada com o abandono de todos. idolatravam esse homem, mas qd ele fica vegetativo ninguém dá apoio a essa mulher, nem ao menos financeiro que fica abandonada a própria sorte. bem ressaltado a tia que apesar de ter uma profissão condenada em vários países, até mesmo aqui, é a única que acolhe, protege, alimenta e dá dinheiro a essa mulher abandonada a própria sorte. esse filme é muito bom. beijos, pedrita

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    1. Aprecio filmes assim, que denotam os aspectos culturais e socioeconômicos de países estrangeiros. Embora o filme se mostre aparentemente simples, exite uma gama fantástica de acontecimentos curiosos em seu desenvolvimento que são impossíveis de não chamar a atenção. Fiquei surpreso com o desfecho! Gostei muito do filme.

      bjus

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