sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Crítica: Crime em Palmetto | Um Filme de Volker Schlöndorff (1996)


Baseado no livro "Just Another Sucker" escrito pelo inglês James Hadley Chase, e roteirizado por E. Max Frye, “Crime em Palmetto” (Palmetto, 1998) é um filme noir bem ambientado em pleno anos 90. Mostra aquela qualidade do gênero onde o espectador pode constatar que a mulher pode ser a glória ou a desgraça de um homem. E essa é a essência de um bom film noir, que mais do que uma vítima masculina apropriada, precisa de um femme fatale convincente. Enquanto Woody Harrelson se debate enlouquecido pelas circunstâncias da trama, que oscilam entre comédia e tragédia, Elisabeth Shue esbanja sensualidade e astúcia como requer a necessidade. Ainda por cima, tem Gina Gerson belíssima em seu papel para completar e enriquecer as várias reviravoltas desse thriller.

A história acompanha a trajetória de Harry Barber (Woody Harrelson), um ex-jornalista que foi preso por engano e posteriormente libertado após dois anos detido. De mal com a vida, a única coisa que o faz permanecer na cidade é Nina (Gina Gerson) com quem está vivendo junto. Desiludido em um bar, Rhea Malroux (Elisabeth Shue) cruza seu caminho com uma proposta tentadora de negócios. Ela é casada com um dos homens mais ricos da cidade, que mesmo que esteja terminalmente mal de saúde, ainda vai demorar sua partida desse mundo. Nesse momento que começa a jogada de mestre. Barber se encarregaria de cumprir a parte burocrática de sequestrar falsamente sua enteada Odete (Chloë Sevigny) que também está envolvida no golpe. Ele ficava com cinquenta mil dólares de um montante de quinhentos mil que seria dividido entre elas do pagamento do resgate. Barber reluta a princípio, mas topa o golpe. Porém após o sequestro tudo foge de controle, pois de um falso sequestro a situação se inverte para um verdadeiro assassinato, e que convenientemente todas as pistas apontam para ele como único autor do crime.


O personagem de Harrelson age na trama de forma bilateral, pois ao mesmo tempo em que está envolvido no crime de sequestro, passa ironicamente a ser responsável pelo freio da impressa ávida por noticias sobre o caso. Por mais cômoda que seja sua situação diante desse golpe, graças às possibilidades que essa inusitada função lhe agregaria, nada corre de acordo como o planejado, devido ao fato, de seu personagem nessa trama ser apenas uma ferramenta no joguete da verdadeira criminosa dessa história. Seduzido e emburrecido pela beleza e sensualidade das mulheres que dividem a tela com ele, em especial a atriz Chloë Sevigny, cujo papel concilia uma Lolita com a experiência de uma mulher feita, Harrelson apresenta uma interpretação inspirada de um personagem inevitavelmente previsível nas mãos de uma mulher, mas ainda assim fascinante por sua composição simplista. 

O show fica por conta do elenco feminino, que tem os melhores diálogos e é responsável pela manipulação do personagem de Harrelson, que invariavelmente não esconde seu espanto e indignação por sua condição desfavorável na trama, que climaticamente tem cerca de umas quatro reviravoltas emocionantes. Contudo, nenhuma distante do enredo ou inverossímil. A cena dele abrindo o porta-malas para um policial, sabendo da existência de um corpo no interior, varia entre um destino trágico a um desfecho cômico. Pode ser considerada uma cena improvável, mas ainda assim necessária em função da criação de um bom entretenimento moderno. Como as cenas sensuais exibem uma beleza visual estética apurada muito bem conduzida por uma edição consciente de Peter Przygodda do que se deve ou não mostrar sem causar frustração do espectador ansioso por uma cena mais quente.


O filme pode ser rotulado como confuso a primeira vista, mas basta lhe dar tempo para que ela se mostre fascinante. É quase impossível que o espectador não sofra com as angústias de Barber, que mais cedeu a tentação desse golpe pela atitude sedutora de Elisabeth Shue, do que propriamente pelo dinheiro. Sua integridade se desfez junto com o fim de sua abstinência alcoólica. Ele até começa firme diante do vício, mas basta vislumbrar a desgraça na qual se meteu para perder o rumo das coisas de vez. Seu personagem acaba ficando a mercê do desejo de uma femme fatale a espera do inevitável. Muito do fascínio da história desse longa pode ser atribuída a direção de Volker Schlöndorff, precisa na narrativa do gênero, e da trama de James Hadley Chase, que curiosamente jamais conhecera a cidade de Palmetto na verdade.

Obviamente “Crime em Palmetto” não destrona clássicos do gênero, mas entretém o espectador de maneira competente. E pela leveza da trama que associada à interpretação tragicômica de Woody Harrelson inclusive diverte muito. Com os requintes de uma produção caprichada, que usa com perfeição todos os macetes necessários para compor um bom thriller, esse longa-metragem, apesar de alguns mínimos derrapes está perfeito como está.

Nota:  8/10

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Crítica: O Caçador | Um Filme de Daniel Nettheim (2011)


Baseado no romance de Julia Leigh, o filme "O Caçador" (The Hunter, 2011) até pode ser confundido a primeira vista como apenas mais um filme estrelado pelo incessante trabalhador Willem Dafoe. Com uma filmografia com mais de setenta filmes, raramente ele não deixou passar um ano sem emplacar um lançamento. Entre trabalhos curiosos como “A Sombra do Vampiro” (2000) onde está irreconhecível sob camadas de maquiagem; comerciais como o Duende Verde em “Homem Aranha” (2002); ou filmes emblemáticos como o combatente traído do Vietnã em “Platoon” (1986). Trata-se de um dos atores mais talentosos de sua geração, muitas vezes mal aproveitado, e que felizmente não é o caso dessa produção. Em “O Caçador” ele interpreta um mercenário enviado a uma terra distante no cumprimento de ordens de uma empresa de biotecnologia militar, com a missão de encontrar o paradeiro do que seria o último Tigre da Tasmânia do mundo – o animal está oficialmente extinto desde a década de 30. Para completar a missão, ele precisa matar o animal, sumir com os vestígios mortais e trazer amostras de seu DNA com a finalidade de reproduzir a toxina paralisante que o animal detém em sua natureza selvagem. 

Na trama que começa com sua chegada a um território inóspito, ocultando dos moradores locais suas verdadeiras pretensões, passa a residir numa casa de família na região. Dafoe passa a conviver com essa família traumatizada pelo desaparecimento do marido – o lar era composto por uma dona de casa, mãe de dois filhos – onde o protagonista é visto como um pesquisador forasteiro. A mãe tem fortes indícios de depressão causados pelo sumiço do marido e Dafoe passa a conviver com as dores que esse desaparecimento causara. Com uma narrativa que aborda esse drama familiar, o protagonista se vê transformado diante das circunstâncias. Quando chegou a essa terra era um homem obstinado por objetivos e resultados, frio e calculista. Porém o contato mais pessoal com a dor alheia causou um amolecimento de seu coração demonstrando o quanto esse homem durão pode ser sensível quando exposto as eventos que aflorem sensibilidade. 

O filme tem uma produção simples, presa a um ambiente mínimo e visualmente rico, bem explorado por uma fotografia lindíssima, e acentuado por uma trilha sonora hipnótica. Com atuações convincentes e dramaticidade acima da média, foi bem conduzido pela direção Daniel Nettheim, que alterna entre muitos focos, o trauma familiar e o objetivo do protagonista de maneira bem medida. O que poderia ser somente um filme para pagar contas na mão de um ator menos capaz, através da interpretação de Willem Dafoe, esse filme “O Caçador” consegue ser relevante dentro de sua filmografia. Dafoe estudou técnicas de sobrevivência e treinou métodos de caça para compor seu personagem de forma convincente, além de ler a obra que inspirou o filme. O resto ficou por conta de seu talento natural de dar magnitude a personagens inicialmente interessantes.

Nota: 7,5/10


Crítica: The Spirit - O Filme | Um Filme de Frank Miller (2008)


Com visual noir e estilizado o desenhista Frank Miller assume definitivamente a cadeira de diretor e faz sua estreia na direção através "The Spirit - O Filme(The Spirit, 2008), homenageando assim seu mentor Will Eisner ao transpor para o cinema um de seus trabalhos mais marcante no ramo dos quadrinhos. Seguindo a estética visual adotada por Robert Rodrigues em “Sin City, que recriou com perfeição cada página de sua fonte para a película de uma forma nunca antes vista, Frank Miller se arma com as mesmas ferramentas e dá vida ao policial assassinado Denny Colt e que volta a vida misteriosamente fazendo o papel de vigilante em uma cidade tomada pelo crime.

O artista gráfico Will Eisner começou sua carreira de ilustrador em jornais e revistas pulp fiction. O personagem de “The Spirit” apareceu através de uma encomenda da Quality Comics para suprir uma necessidade por histórias em jornais dominicais, que foi desencadeada pelo boom dos quadrinhos, liderado pelo Superman e Batman. Eisner foi inovador na hora de desenvolver suas histórias para adultos e costumeiros leitores de jornal. Queriam que ele criasse um vigilante uniformizado para concorrer com os personagens da DC Comics. E em toda sua simplicidade, Eisner apenas lhe concedeu uma máscara que também atendia ao pedido da editora. O personagem Spirit, era o policial Denny, morto e trazido de volta à vida, que se escondia numa caverna sob seu túmulo, e combatia na noite os criminosos mais bizarros que se podia imaginar. Seu personagem era uma representação da luta do homem comum em um ambiente urbano, distanciado da fantasia dos super-heróis consagrados, e que apresentava perfeitas metáforas da vida real através da visão do autor onde misturava humor e violência. 

O filme “The Spirit” acompanha Denny Colt (Gabriel Match) um colaborador da policia de Central City, que trabalha em conjunto com o comissário Dolan (Dan Lauria) e sua filha, Ellen (Sarah Paulson), a qual mantinha constantes flertes entre muitas outras personagens femininas que transitam pela tela. Seu arquirrival é Octopus (Samuel L. Jackson) que também, como Denny Colt, se apresenta invulnerável, e em certo momento, responsável por essa peculiaridade. Octopus conta com a ajuda de sua assistente ambiciosa Silken Floss (Scarlett Johansson) deslumbrante e perigosa.  Sand Saref (Eva Mendes) é uma ex-paixão de Colt, que transformada em vilã após vários anos desaparecida, surge em cena para roubar um tesouro de posse de Octopus. No encalço do herói ainda há Lorelei (Jamie King) uma entidade sobrenatural que deseja o Spirit que tarda por morrer. No meio de todas essas mentes criminosas, Spirit luta contra o crime e por respostas para sua imortalidade. 

Frank Miller, certa vez declarou que jamais cogitou a possibilidade de abandonar a atividade de roteirista e desenhista de quadrinhos para assumir a função de diretor de cinema. Ainda bem. Por mais que a trama desse longa seja bem feita, a produção seja bem acabada, “The Spirit” não se aproxima do brilho de seu trabalho em “Sin City”, apesar das infinitas semelhanças. E talvez este seja seu calcanhar de Aquiles. Mesmo com um trabalho elegante e bem afinado, o personagem de destaque que dá título a essa produção, não desperta o mesmo carisma no espectador como aqueles que transitam no longa que dirigiu em parceria com Robert Rodrigues – principalmente nos menos familiarizados com as suas origens. Composto com vários elementos de outros trabalhos de Miller, como Batman, sua transposição para o cinema foi debilitada pelo excesso de comparações que não funcionaram bem como homenagem da forma que Miller projetava em teoria. O personagem sofre de uma síndrome de falta de originalidade que não se pode culpa-lo. Eisner criou um personagem a sombra de seus concorrentes a dezenas de anos atrás, e que mesmo obtendo reconhecimento, não alcançou a glória dos mesmos. Naturalmente Miller transpôs para película um produto necessariamente fiel, contudo corrompido e sem culpa. Aproveita assim para fazer homenagens a momentos da história real, como quando Denny Colt ainda um garoto, folheia uma revista em quadrinhos (Crime SuspenStories) tendo na capa um homem enforcado. Foi na época, o que o movimento conservador precisava para estabelecer censura, justificada por sugerir que gibis incitavam a delinquência juvenil. Apesar de Miller construir um universo visualmente distante da realidade, não perde a oportunidade de mesclar elementos factualmente relevantes no contexto.  

O elenco no qual desfila beldades como Eva Mendes e Scarlett Johansson, e astros como Samuel L. Jackson, não seguram a trama com devido interesse. São personagens fantásticos em um ambiente de difícil contextualização. Suas atuações são bacanas, mas muito andrógenas e comportadas. Como em todo o universo da graphic novel, seus personagens são exageradamente excêntricos e visualmente sinistros. O que é bom e necessário para essa produção. Mas Gabriel Match ainda não tem o carisma necessário sobre o grande público para estampar como cabeça uma produção que é baseada em quadrinhos, nos quais os fãs são extremamente críticos diante de alterações – apesar das semelhanças físicas perfeitas na composição do personagem – se posicionam ávidos em protestar diante de detalhes não cativantes.

Dificilmente “The Spirit - O Filme” constará na lista de fãs dos quadrinhos como uma adaptação emblemática no cinema. Miller tratou seu projeto com carinho ao trabalho de Will Eisner, e respeito ao formato dos quadrinhos. Ele conseguiu arquitetar seu longa com alterações necessárias para essa relação cinemão/HQs, e recheou com homenagens sutis ao formato dos quadrinhos, que em sua maioria passa desapercebida ao público convencional, mostrado que mesmo não apresentando algo espetacular como esperado por seus fãs, ainda sabe o que pode fazer, frente a um roteiro ou atrás de uma câmera. 

Nota: 6/10

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Southland Tales & Action Comics | HQs



O que veio primeiro? O ovo ou a galinha? Bem... enquanto está cada vez mais comum vermos diretores fazerem transposições de personagens e histórias em quadrinhos para o cinema, seguindo uma tendência em alta, alguns cineastas fazem o caminho inverso. Ousam inserir suas iniciativas na mídia de HQs como uma oportunidade de tirar uns tostões a mais de um projeto concluído, ou uma superação de um fracasso inesperado.

Pôster do filme Southland Tales

 Richard Kelly, cineasta responsável pelo cultuado “Donnie Darko” (2001), como forma de superar o fracasso de “Southland Tales” (2006) – uma estranha ficção cientifica – no festival de Cannes, decidiu lançar a adaptação do filme em quadrinhos, numa minissérie dividida em três partes para dar mais profundidade a seu projeto cinematográfico. Enquanto o filme se apresenta confuso e pouco enfático, seu trabalho nos gibis demonstrou ser mais interessante do que se poderia esperar. 


Southland Tales (de Richard Kelly, Brett Weldele, 96 págs), conta a história de um astro do cinema encontrado sem memória no deserto, de uma atriz pornô dona de um reality show e um policial que é a chave de uma conspiração americana. O filme tenta, mas não consegue cativar o público como a HQ, tanto que o filme foi lançado por aqui  diretamente em DVD, devido a péssima recepção que teve no mercado internacional. 


Assim também Richard Donner retorna ao personagem que o consagrou nas telonas e ele ajudou a tornar ícone pop. A Action Comics 844 (de Geoff Johns, Adam Kubert e Richard Donner, 32 págs) juntam-se na criação de um gibi sobre uma história que envolve o Superman. Na trama de Donner, mostra a curiosidade do Homem-de-Aço à chegada de uma nave espacial trazendo em seu interior um garotinho que possivelmente também é Kryptoniano. Não é criado com a proposta de radicalizar o universo do personagem, porém é bem contextualizado como um episódio singular, sem influência sobre a trajetória do personagem a longo prazo.

Tanto um quanto outro projeto tem seus méritos em seu visual e nas tramas bem elaboradas. O trabalho de Donner é mais simples por trabalhar um personagem oriundo do formato, entretanto Kelly, mostra toda sua genialidade numa área diferente da qual se consagrou quando lançou o curioso filme “Donnie Darko”.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Crítica: 007 – Cassino Royale | Um Filme de Martin Campbell (2006)



Para qualquer um que tenha entortado o nariz para as aventuras do agente James Bond anterior a esse filme, principalmente nos últimos episódios, esse espectador pode e deve reavaliar seu julgamento quanto a uma das maiores franquias da história do cinema. Através desse longa-metragem, que resgata suas origens (que é baseada no primeiro livro de Ian Fleming) mostra a melhor aventura do agente secreto em décadas. Com a escolha de um protagonista que gerou polêmica entre fãs e uma narrativa mais “realista”, esses aspectos fazem desse filme intitulado "007 – Cassino Royale" (Casino Royale, 2006) uma das melhores surpresas dessa resistente série, que soube se reinventar na hora certa e cativar novamente um público que via no personagem James Bond um ícone desfigurado criativamente. 


Com uma introdução retrô (filmada em preto-e-branco) logo de cara somos familiarizados com a promoção a 00 que o espião inglês James Bond (Daniel Graig) conquista ao assassinar duas pessoas. A primeira morte é exibida de forma crua, violenta e extremamente realista. Enquanto a segunda, de um membro da inteligência britânica é mostrada de forma elegante e igualmente fatal. Após uma promoção merecida, não demora muito para que o desajustado agente especial inflame o ânimo de sua chefe M (Judi Dench) resultante de uma perseguição emocionante a um terrorista em Madagascar que ganha destaque internacional. Como era de se esperar de Bond, ele não descansa e segue as pistas que o levam a impedir um atentado terrorista a um avião. Seu sucesso nessa missão o leva a se confrontar com Le Chiffre (Mads Mikkelsen) que endividado com seus contratantes devido ao fracasso da explosão, precisa reaver o dinheiro perdido de seus investidores em uma mesa de pôquer no Cassino Royale. Porém Bond tenta vencer Le Chiffre em seu jogo, para poder chantageá-lo em troca dos nomes das verdadeiras mentes criminosas por trás de seu personagem, contanto que convença Vesper Lynd (Eva Green) uma contadora do MI6 representante do tesouro inglês, que pode ganhar no jogo e ter sucesso na missão.

Esse filme põe todas as cartas na mesa ao mostrar uma versão humana de James Bond nunca antes vista, e abre mão de elementos marcantes da série (o agente dispensa bugigangas malucas) atendo-se a uma abordagem mais realista em comparação aos parâmetros pré-estabelecidos pela produção, como também apresenta um antagonista igualmente humano, descartando objetivos como dominar o mundo, destruí-lo ou coisa parecida. O único objetivo do vilão é ganhar dinheiro, umas das metas mais humanas que se poderia imaginar como motivação pessoal. Isso sem contar com a personagem de Eva Green, que possivelmente foi até então uma das Bond Girls mais inteligentes e lindas que cruzaram o caminho do agente especial, tanto que, não pudera foi talvez à única mulher pela qual James realmente nutriu algum sentimento verdadeiro em sua trajetória. Apesar de um flerte relâmpago com Caterina Murino, o protagonista demonstra estar mais responsável e obstinado em seu papel dentro da espionagem, como a Bond Girl deixa de ser somente um rostinho bonito dentro da trama. 

Uma das concessões mais acertadas dessa produção, talvez tenha sido a eliminação das extravagâncias tecnológicas ao qual o personagem era munido a cada episódio. De carros controlados por controle remoto a carros invisíveis, esses exageros delirantes apagavam o brilhantismo do personagem. Os carros luxuosos e sofisticados ainda transitam pelo longa, mas atidos rodar como máquina de transporte e mais nada. A ação de espionagem fica a cargo da astúcia do personagem e a recursos mais sintonizados com a realidade do que com a ficção cientifica, aproximando a imagem de James Bond a outros agentes como Jason Bourne e Jack Bauer antenados com seu tempo, e que por sinal não fizeram feio diante do ícone inglês.

A trama mais movimentada e violenta é outra escolha bem sucedida desse longa. Não que as anteriores não tivessem esse elemento, mas não com tamanha competência. A sequência inicial bem ao estilo made in Hong Kong dá a noção exata disso. Dessa vez, James soa e sangra como nunca antes aconteceu – coisa rara em si tratando de Bond – usando toda sua aparência atlética como elemento fundamental para dar coerência ao enredo e delírio ao público feminino. A cena da tortura entra em um seleto rol de sequências do gênero memoráveis pelo sua desenvoltura angustiante ao mesmo tempo hilária. No entanto, não é apenas de músculos e socos que o protagonista se arma para convencer, pois as estratégias de espionagem e as nuances de seu personagem estão presentes e ativas – seu comportamento na mesa de jogo é fomentado com base na técnica de jogadores profissionais. Seus diálogos mais marcantes não se resumem a uma dúzia de frases feitas, e sim a duelos verbais antológicos, onde um deles, talvez um dos melhores, é divido com a personagem de Eva Green quando se conhecem nas dependências de um trem a caminho do Cassino, ou quando se deslocavam em direção ao hotel onde se hospedariam.

E se a trama é boa, deve-se a contribuição feita pelo roteiro de Paul Haggis que divide os créditos com os roteiristas convencionais da franquia. Mexeram com precisão no livro que inspirou esse filme, destilando e fazendo acertos na transposição literária para versão cinematográfica perfeitamente. Diretores como Quentin Tarantino já mencionaram ter interesse em transpor o livro de Ian Fleming para a telona, quando Pierce Brosnan ainda desempenhava o papel de James Bond, desde que a história se seguisse após os eventos ocorridos em “007 A Serviço de Sua Majestade”. Mas a produtora Barbara Broccoli já enfatizava que Tarantino era um cineasta único em sua forma de criação, o descartando pelo fato da franquia ter certos critérios narrativos que necessitam ser preservados sem alterações.

Por sua vez, Martin Campbell que já havia dirigido “007 – Um Novo dia para Morrer” foi incumbido da tarefa de mostrar a revolução da série. Depois de dirigir um dos maiores sucessos de bilheteria da franquia, ele ficou responsável por apresentar as novas gerações um James Bond diferente do qual seus pais conheceram. Mas nem tudo é alegria: o prolongamento da trama que enfoca o par romântico Craig/Green em um terceiro ato após um presumido clímax se demonstra extenso demais, demonstrando um excesso tempo desnecessário apesar de bem realizado.

"007 – Cassino Royale" volta no tempo e se apresenta como uma ótima diversão que há tempos não víamos na franquia. Mostrando um James Bond recriado do zero, marcantemente repaginado e que agora tem um ator que injeta perigo e arrogância em sua postura (bem diferente do anterior) através de uma narrativa que abandona de vez o fantástico pelo realismo. Simplesmente, essa produção apresenta o melhor Bond desde a aposentadoria de Sean Connery.

Nota: 8,5/10


sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Crítica: Jonah Hex – O Caçador de Recompensas | Um Filme de Jimmy Hayward (2010)


Esse longa é uma adaptação dos quadrinhos de faroeste da DC Comics de mesmo título, ao qual a Warner Bros., detentora dos direitos do personagem, depositou suas fichas depois dos inquestionáveis sucessos da franquia “Batman” realizada por Christopher Nolan, tinha a pretensão de pegar carona na boa fase do estúdio. Porém, o cowboy caçador de recompensas não chega nem perto de se igualar ao Homem-Morcego em notoriedade ou em qualquer outro aspecto, como também o diretor estreante dessa produção nem se compara ao experiente cineasta que elevou o gênero dos quadrinhos para as telonas a níveis nunca antes alcançados. Portanto o resultado dessa produção intitulada "Jonah Hex – O Caçador de Recompensas"(Jonah Hex, 2010), era mais do que esperado de ser um fracasso comercial e de crítica. 

Com uma história focada em Jonah Hex (Josh Brolin), um pistoleiro e caçador de recompensas desfigurado, que sobreviveu depois de ser vitima de uma vingança errônea, flerta constantemente com o ocultismo após a tragédia – desenvolve uma capacidade de falar com os mortos. Dentre os vivos, sua única conexão resistente permanece com a prostituta Leila (Megan Fox). Jonah é contratado pelo governo americano para capturar Quentin Turnbull (John Malkovich), um perigoso terrorista que planeja recuperar seu poder sobre a economia americana que lhe foi tirada após a Guerra Civil Americana, e que por sinal, é o mesmo homem que marcou seu rosto com cicatrizes e suas lembranças do passado com consternação. Por mais que sua aparência estética remeta a um filme de faroeste, fãs do gênero ficarão decepcionados com essa produção, que descarta qualquer possibilidade de compará-lo a algum sucesso do gênero, devido à narrativa pouco explorada com esse foco. Trata-se de um espetáculo visual recheado de explosões e sequências de ação pouco, a nada criativas que substituem qualquer tentativa de dar profundidade a trama ou aos personagens, que até em sua premissa, se apresentam interessantes, mas não se confirmam da mesma forma ao decorrer da película.

O elenco apesar de estar composto por grandes astros e promessas de atores talentosos, que apenas se confirmaram assim em trabalhos posteriores, seus desempenhos tiveram resultados de regulares a desinteressantes. Muito pelo roteiro, repleto de diálogos constrangedores, como pelas situações clichês inúteis pelas quais os protagonistas são submetidos. Josh Brolin interpreta uma espécie de John Constantine confederado, violento e visto como uma lenda, que se apresenta pouco expressiva em sua totalidade. Enquanto a dupla de vilões, Quentin Turnbull e Burke, interpretada por John Malkovich e Michael Fassbender são muito mais atores do que podem oferecer devido as deficiências estruturais da proposta oferecida através desse longa. Por fim Megan Fox, o apelo sensual necessário dentro da trama, interpreta uma prostituta convenientemente habilidosa com armas.
 
Depois de vários trabalhos de animação onde o cineasta Jimmy Hayward teve seu envolvimento, a migração para o formato live-action não foi lá muito feliz. Sua competência que o destacou em animações no passado não trouxe a experiência necessária para conduzir uma proposta tão confusa quanto essa produção – um filme de faroeste esquecido pela enorme quantidade de cenas de ação exageradas e sequências pretensiosas de adrenalina pouco climáticas. Por fim, "Jonah Hex – O Caçador de Recompensas" pode ser um filme legal caso o espectador não alimente expectativa. Porque como seus pretensiosos realizadores, que achavam que tudo estava certo e acertado para o lançamento, eles deram com os burros na água. Tanto que no Brasil, inclusive esse filme foi lançado diretamente em DVD e Blu-ray pela decepção desencadeada no mercado americano, que a propósito, ocorreu a Guerra Civil Americana onde se passa toda a trama.

Nota: 5/10

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Crítica: Se Beber, Não Case! Parte II | Um Filme de Todd Phillips (2012)



Seguindo a linha narrativa do sucesso do primeiro filme lançado em 2009, que apresenta os confusos percalços dos protagonistas a partir da perspectiva deles mesmos, a comédia "Se Beber, Não Case! Parte II" (The Hangover Part II, 2012), é a reconstituição improvável, embora divertida de mais uma despedida de solteiro de causar amnésia aos envolvidos, e que ainda sob o efeito da ressaca e com as marcas da esbornia no corpo, tentam refazer suas andanças noturnas para preencher as lacunas presentes na memória sobre a fantástica farra ocorrida, a qual ninguém possui uma lembrança que faça algum sentido na íntegra.

Com a premissa semelhante ao primeiro filme, os protagonistas: Phil (Bradley Cooper), Stu (Ed Helms) e Alan (Zach Galifianakis) viajam as vésperas do casamento, agora de Stu, que vai casar em um grande resort na exótica Tailândia. Como era esperado, novamente são dopados e se embebedam ao extremo as vésperas da cerimônia do casamento. Como se a bebedeira não fosse o suficiente para colocá-los em maus lençóis, para piorar a situação, dessa vez os protagonistas perdem um quarto membro da trupe, que é o irmão mais novo da noiva de Stu, adorado e idolatrado pela família. Numa busca alucinante por Bangcoc fazem um retrospecto da noitada para encontrar o jovem desaparecido, ao qual não fazem ideia do seu paradeiro. Entre personagens extremamente bizarros, situações exageradas e muita loucura, saem pelas ruas da cidade para encontrar o irmão da noiva antes que a família descubra seu desaparecimento.

Tanto o elenco quanto toda produção repetem a empreitada do filme anterior sem mudar uma vírgula da narrativa adotada, que consagrou essa comédia com ares de inovação num mercado extremamente difícil de ganhar notoriedade. Se os personagens tiveram a sensação desagradável de deja vú ao se depararem com as consequências da farra, eles não imaginam a decepção do espectador quando ao final desse longa vislumbraram uma sequencia praticamente igual ao primeiro filme. Dentre as mudanças de locação, a aplicação de exageros extremistas, o filme não trouxe nada de novo a franquia. 

O roteiro de Craig Mazin e Scot Armstrong inclusive brinca de forma irônica com a história, quando aplica situações em volta do desfecho do filme anterior logo de cara, insinuando que esse filme seria diferente. Não passou de insinuação. Todo resto tem um vinculo fortíssimo com a ideia que consagrou essa produção, deixando o sustento desse filme sobre as costas do elenco carismático e as situações as quais são expostos. Resgatam personagens do primeiro filme, ao mesmo tempo em que inserem outros menos interessantes para engordar a trama – Paul Giamantti tem um talento cômico fantástico mal aproveitado. O destaque ainda fica por conta de Alan, interpretado por Zach Galifianakis, o mais estranho e excêntrico membro da turma.

Por pouco, "Se Beber, Não Case! Parte II" podia ter conseguido atender as expectativas do espectador ansioso por uma surpresa como foi exibido no primeiro filme, mas infelizmente a direção de Todd Philips, apenas se concentrou em superar as esquisitices do primeiro como forma de dar seguimento à franquia, deixando evidente as motivações comerciais e pouco habilidosas dessa produção. No resta esperar pelo terceiro capítulo dessa empreitada para ver no que vai dar.

Nota: 7/10