quarta-feira, 1 de julho de 2015

Crítica: A Gangue | Um Filme de Miroslav Slaboshpytskiy (2014)


Uma das sensações do Festival de Cannes 2014, “A Gangue” (The Tribe, 2014) é um drama ucraniano escrito e dirigido por Miroslav Slaboshpytskiy. De raros aspectos narrativos, essa obra se mostra uma obra visceral e polemica. Ganhador do Grande Prêmio da Semana de Crítica no Festival de Cannes, essa produção fez história nesse festival como poucas. Totalmente realizado na linguagem de sinais, obviamente condizente com o enredo, a estreia do cineasta é um autêntico produto contemporâneo que miscigena com habilidade competência e originalidade. Todo filmado com um elenco de atores surdos-mudos, toda comunicação que decorre por quase duas horas é totalmente realizada de forma gestual, embora a ausência de palavras não gere um empecilho significativo para sua compreensão. O diretor já havia feito antes um curta-metragem chamado “Surdez” em volta da temática. Mas as ações apresentadas nesse longa-metragem falam por si. Em sua trama acompanhamos Sergey (Grigoriy Fesenko), um garoto surdo-mudo que recém se estabelece nas dependências de um colégio interno especializado na educação de jovens com essas deficiências físicas. Logo após sua chegada ele é incorporado a uma gangue de estudantes cruéis que se dedicam a conduzir negócios focados em roubos e prostituição. Atividade essas que são curiosamente endossadas pela liderança de um professor da instituição. Rapidamente Sergey ganha a confiança dos membros da gangue, porém ele se apaixona por uma das garotas que servia como prostitutas. Essa paixão desencadeia uma necessidade de ganhos urgentes que o levará a tomar decisões nunca antes imaginadas por esse jovem calouro. 

Talvez seja desnecessário expor com prioridade que “A Gangue” não é para todos os públicos. Mas é imprescindível que seja proferido que se trata de uma produção digna de aplausos por seu brilhantismo e audácia. De estética nervosa pela forma com que opera a interação do elenco restringida a linguagem de sinais; chocante pela crueza de certas imagens que não se censuram pela necessidade de seu realizador de conferir realismo e uma profunda exploração das possibilidades de sua história; e de uma violência e sexualidade marcante para memória, o trabalho de Miroslav Slaboshpytskiy poderia facilmente ser rotulado como uma aparição forçada em um grande festival. Filmes como “Irreversível”, de Gaspar Noé em 2002 e “Anticristo”, de Lars Von Trier em 2009 ganharam fama por surgirem no mesmo festival de maneira apelativa. Mas no caso de “A Gangue” não, já que o filme se propõe a muito mais do que chocar o espectador. Ainda que os detalhes dos acontecimentos mostrados no decorrer do longa-metragem fujam aos olhos da maioria (pela ausência de diálogos e legendas), as ações falam por si e os fatos se esclarecem naturalmente. É necessário ter uma grande habilidade na condução de um desenvolvimento desses, e com a ajuda de um elenco formidável de jovens surdos-mudos tudo ocorre com o máximo de clareza necessária para uma boa compreensão das passagens. Não há obstáculos narrativos que não são possíveis serem ultrapassados com a devida paciência do espectador. Desde o princípio, “A Gangue” é uma proposta interessante que dispensa palavras e mostra atitude. Embora não seja categoricamente surpreendente (porque facilmente divide opiniões), o resultado tem a capacidade de surpreender espectadores que apreciam trabalhos cinematográficos com algum diferencial.

Nota:  8/10

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